COVID-19: por que tantas previsões erradas sobre o pico da doença no Brasil?

Diante da pandemia do #COVID-19, e acredito que em função da minha área de atuação, algumas pessoas já vieram conversar comigo para debatermos “por que se erra tanto na estimativa de quando será o pico da doença aqui no Brasil?”.

Pois é, quando se trata de projeção o tema é complexo mesmo, mas a gente consegue entender o porquê, quer ver?

Estamos falando de uma situação sem precedentes. Quando não há dados históricos não temos como prever com modelos matemáticos o que se espera do futuro e então a gente recorre aos recursos qualitativos para projeção. Neste caso, pontualmente, fica evidente o uso do modelo da Analogia de Histórico – não há nada parecido no Brasil, então os especialistas buscam situações equivalentes ou similares para projetar o que pode acontecer aqui, mediante o que aconteceu nesta situação similar.

Apesar de sabermos que o dado oficial pode não ser exatamente o dado real (por diversos fatores que não fazem diferença se abordados neste texto), para projetar esta curva de crescimento da doença no Brasil os especialistas partem dos dados quantitativos oficiais do número de infectados e o tempo desde que isso começou por aqui. Isso compõe a tal curva de crescimento da doença (uma função exponencial).

Como o contexto é um contexto vivo, a partir desta curva estimada as decisões precisam ir sendo tomadas (muitas vezes com base em analogia de histórico, já mencionada) e os resultados vão influenciando a evolução dos dados oficiais, ou seja, o que foi projetado por meio da função tem a validade minimizada já que aquele histórico deixa de ser 100% representativo – como eu sempre reforço, os dados históricos servem para projetar um futuro que as condições se mantenham estáveis, ou em outras palavras, sem qualquer alteração. Usar o aprendizado de situações equivalente para ir formatando hipóteses e descobrindo as relações de causa e efeito é a principal forma de fazer, já que não temos nosso próprio histórico de COVID-19, que considera as peculiaridades de clima, infraestrutura e até de genética dos brasileiros.

Veja quão complexo é o cenário: usa-se um histórico para prever um futuro e antes que este futuro aconteça toma-se decisões para mudar aquilo que poderia acontecer!

Eu pessoalmente acredito que o fato de este pico estar sendo adiado tenha relação direta com o isolamento social da população – analogia, aprendizado de outras nações aplicado no Brasil, método qualitativo de projeção – mas claro, pode ser até que tenha outros fatores, particulares do Brasil, que sejam desconhecidos… não sabemos. Considerando a taxa de contaminação, a medida que as pessoas vão aderindo ou não ao isolamento este cálculo vai sendo refeito (e talvez por isso recentemente começaram a divulgar uma taxa de adesão da população ao isolamento, um dado que eu apostaria ser importante neste contexto, que deve ser considerado na projeção).

Além disso, como sempre falo, é equivocado acreditar que as projeções são feitas para acertar. Mesmo os modelos quantitativos de projeção são feitos para que se erre menos acerca de um futuro desconhecido.

Isso que estamos vivendo se tornará mais um case para aulas de estatística também, não só de história 😉

Daniela Benetti Pelagalo especialista em inteligência de mercado, pesquisa e estatística aplicada, professora universitária e fundadora da Maena Inteligência Analítica.

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